23 de fev. de 2016

Cumplicidades

Imersa numa humanidade de caráter tão violento me percebi surpreendida com um simples acontecimento do cotidiano. Um caso de cumplicidade. Não daquelas que dizem respeito a parcerias na culpa ou responsabilidade por furtos ou outros crimes hediondos nas quais uma dupla ou um grupo se protegem e apoiam para causar medo e obter proteção. Mas àquele tipo de cumplicidade que só recebemos e/ou construímos com alguém que nos compreende, que consegue se colocar no lugar do outro e assim também em nosso lugar. Seja por via de uma cumplicidade egoísta onde os EUs se aliam em função dos mesmos interesses, como a criação dos filhos, por exemplo, seja por algum tipo de cumplicidade narcísica onde um afeto brota por meio de identificações e ideais.
Freud nos presenteou com os conceitos de Eu ideal e Ideal de Eu para compreender melhor as identificações e o amor inerente a cumplicidade. E Lacan nos disse que amar é dar o que não se tem. Isto é, para e pelo amado nos tornamos outro e somos capazes de criar em nós até mesmo novos sabores e cores que condigam com o desejo do "objeto" idealizado.
Eu diria que um amor, quando da ordem de uma verdade, mesmo que sustentado pela ilusão que o caracteriza, atravessa o tempo, viaja para a dimensão do impossível e dá o que de mais precioso há: a vida. Essa cumplicidade no viver ou morrer por amor ao outro, surpreende-me cada vez mais nesse mundo de contrastes, onde facilmente se destrói em nome de um Outro ou de um Deus. Que a cumplicidade, produção do amor, se estenda "ut orbis".

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