7 de ago. de 2012
Em Meio a Essa Luta, Eu Danço. Reflexões sobre o espetáculo "Em meio a Este Luto , Eu Luto".
Compartilho com vocês o meu texto sobre o espetáculo "Em meio a Este Luto, Eu Luto" de Sílvia Wolff publicado no "Mundo Cult". No texto ainda comento a Dança Ability e a experiência de Pedro Schames Pinheiro enquanto professor.
http://mundocult.com.br/wp/em-meio-a-esta-luta-eu-danco
A vida em seu processo transformador pode ser metaforicamente pensada enquanto uma dança onde cada movimento é um gesto autoral. Pensar a dança enquanto arte é pressupor a criação e a transformação. Assistindo ao espetáculo de dança/teatro “Em Meio a Este Luto Eu Luto” da coreógrafa e bailarina Silvia Wolff, percebo a ideia da dança e sua relação com a arte colocada em pauta. Silvia constrói o roteiro e a temática desta obra aludindo a uma questão que passa a interrogá-la, principalmente após um AVC sofrido em 2007, quando ela perdeu os movimentos de um lado do corpo. Parece-me que Silvia interroga a técnica e a dança clássica em sua extrema demanda de perfeição sobre os corpos e movimentos. O que é a dança afinal? Em um processo de diálogo com o próprio corpo marcado pela falta, os bailarinos, embalados pela música que os envolve como a um maestro com sua orquestra, também criam, fazem a obra “respirar em cena”, citando palavras da diretora. São coautores de seus movimentos imprimindo no espetáculo suas histórias, suas memórias entrelaçadas às de Silvia.
A perfeição exigida pelo ballet clássico, a disciplina que aprisiona o corpo ansiando a captura da diferença, tenta fazer deste um “corpo-objeto”, um corpo para o Outro (Lacan), encarnado aqui por quem ocupa um lugar de suposto saber para o bailarino. Ou seja, seu professor, o primeiro bailarino, sua instituição, enfim, a sociedade desde os seus valores morais e homogeneizantes que internalizamos a partir do discurso e da língua que nos atravessa. É a partir da relação com o Outro que o sujeito se fixa a uma posição subjetiva e constrói o seu fantasma. Buscando adivinhar o que o Outro deseja, cobra e proíbe, o sujeito muitas vezes se vê capturado num modo de ser que acredita como o único aceito e possível de conquistar um lugar. Esse corpo passa a servir ao espetáculo e não mais ao sujeito ali presente. Representação plena que só é possível quando deixa de ser uma cena, quando acontece no real da morte, como é apresentado no ato belo e trágico do filme “Cisne Negro”.
O brilho, ainda, desta obra é que atua como um dispositivo, desencadeia no espectador um processo de identificação com o tema proposto. A falta marca todos os corpos, o espetáculo conta a história de todos os sujeitos. “Eu tô presa! Presa num corpo que não serve!”, grita uma bailarina em cena. Quem não se sente ou sentiu assim, se não na juventude, com certeza, viverá essa experiência, pois esse é ou será o destino de cada um de nós. Viver na limitação do próprio corpo. É na relação com a própria condição de ser um humano que a vivemos. Porém, não necessariamente essa experiência precisa ser traduzida em constante sofrimento. Estar na condição de humanos é difícil pela finitude, fragilidade e incompletude inerente a esta. No entanto, é a escolha pela vida que abstrai o sujeito da melancolia pela intolerância com a sua própria falta. E é somente no ato de viver plenamente essa condição que pode advir o brilho do singular, da diferença, da criação e do desejo. O verdadeiramente belo.
Portanto, o espetáculo “Em Meio a Esse Luto Eu Luto” dramatiza na dança e na voz dos bailarinos a vida e a criação de Silvia desde sua experiência mais íntima. Experiência essa que lindamente toma forma em uma obra provocando o desassossego. Desacomodando todos os corpos, sejam os das cadeiras na plateia, os dos dançarinos no palco, o da equipe de produção. Fica a questão: o que é a dança afinal? Pensando esse tema me surge a imagem de um enlace entre criação e técnica, o que me remete, ainda, a um trecho da entrevista de Juliana Oliveira, do Programa Especial da TV Brasil, com Pedro Schames Pinheiro, professor de Dança Ability e cadeirante (http://www.youtube.com/watch?v=6F5SGw4xCeU&feature=youtu.be):
Pedro: “A técnica da pessoa é muito menos importante do que a escuta e a percepção dela para o grupo e para o que está acontecendo no lugar.”
Juliana: “Então, na verdade a pessoa não vai aprender a dançar, ela vai aprender a perceber o redor e se soltar, é isso?”
Pedro: “Isso é dançar...”
Juliana: “Isso é dançar?”
Pedro: “Isso é dançar!”
E eu diria, ainda: isso é viver!
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Peço desculpas pela estrutura do texto não estar separada em parágrafos, etc. Por algum motivo a postagem não está aceitando o formato da edição. Mas podem acessá-lo no link do Mundo Cult. http://mundocult.com.br/wp/em-meio-a-esta-luta-eu-danco
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